Pára-me de repente o pensamento - Jorge Pelicano
"Pára-me de repente o pensamento
Como que de repente refreado
Na doida correria em que levado
Ia em busca da paz, do esquecimento..."
Inicia assim o poema de Ângelo de Lima publicado na revista "Orpheu" em 1915. O poeta e pintor, Ângelo de Lima, é internado no Centro Hospitalar Conde Ferreira (Porto) com o diagnóstico de "Delírio de Perseguição". Miguel Borges queria reencontrar a personagem para uma peça de teatro e, para tal, resolveu transferir-se para o epicentro dos acontecimentos, vivendo durante três semanas no, anteriormente denominado, "hospital dos alienados". Durante este período Miguel vive e partilha as histórias, as refeições, o café, os cigarros, o dia-a-dia dos actuais pacientes da instituição, sempre sob o olhar documentarista de Jorge Pelicano, que registou 250 horas de convívio e que converteu em uma hora e meia, de um delicioso filme sobre a loucura e a lucidez.
Para mim este filme tem um grande peso emocional, quase que uma familiaridade.
Tive o privilégio de estagiar nesta instituição há 10 anos atrás, e guardo histórias que jamais conseguirei esquecer.
Lembro-me de ter ficado algo amedrontada de inicio, pois a própria estrutura sumptuosa do edifico, causava um impacto visual, a que não se conseguia ficar indiferente. Os 120.000m2 de terreno a perder de vista, repletos de jardins e recantos, trazem cravados mais de cem anos de histórias e servem de muralha protectora para quem ali vive. Alguns não querem sair. Têm medo do mundo cá fora... este foi um dos medos dos pacientes que me ficou gravado na pele, na alma e que o Jorge Pelicano consegui captar tão cruamente durante o filme.
Vive-se ali muito mais que a alienação, que a suposta loucura,... há amizades profundas, estados de lucidez, criatividade, bondade, ternura e até histórias de amor.
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